Samuel – Profeta e Juiz em Israel
Personagens da Bíblia (Parte VI)
I – INTRODUÇÃO
Na época do nascimento de Samuel o culto do povo de Israel centrava-se em Siló, na região de Efraim, cerca de 30 quilômetros ao norte de Jerusalém, onde Josué havia fixado o antigo tabernáculo, transformando-o em um santuário mais ou menos permanente (Josué 18:1). Multidões iam a Siló para adorar e oferecer sacrifícios a Deus.
Dentro do tabernáculo estava a arca da aliança, o candelabro com os sete braços, o altar do incenso e a mesa dos pães da proposição. Fora, no pátio, estava o altar de bronze do qual se elevava o fumo do sacrifício que era oferecido a Deus.
Naquele tempo a nação de Israel era governada por juízes, os quais eram suscitados por Deus com o objetivo de livrar o Seu povo de seus inimigos. Quando nasceu o profeta Samuel, Elí era o sumo sacerdote no santuário de Siló, que, além de sumo sacerdote exerceu também a função de juiz em Israel por 40 anos (I Samuel 4:18). A nação de Israel estava atravessando momentos cruciais em conseqüência das violentas investidas por parte dos filisteus e também por causa da terrível degeneração moral do sacerdócio, promovida pelos filhos do sacerdote Eli: Hofni e Finéias.
Em meio a essa confusão política e religiosa surge Samuel, o último dos juízes, e na sua função como profeta, ele andou diante de Israel com integridade de coração e desde a sua mocidade ele levou uma vida de fidelidade, obediência e devoção ao Deus Altíssimo. A sua atuação em Israel foi decisiva e muito especial, pois ele realizou a transição entre o período dos juízes e a monarquia. Ele ungiu os dois primeiros reis de Israel, Saul e Davi. Sendo homem de profunda piedade e discernimento espiritual, ele dedicou a sua vida totalmente à realização dos propósitos de Deus para o bem do povo de Israel.
II – O NASCIMENTO E DESENVOLVIMENTO DO MENINO SAMUEL
As Escrituras Sagradas narram a história de Samuel, concebido em resposta às súplicas de sua mãe Ana, que até então não tinha filhos, por ser estéril (I Samuel 1:5). O pai de Samuel chamava-se Elcana e, segundo a genealogia, ele era levita da família de Coate, da casa de Izar (I Crônicas 6:1, 2, 33-38), considerada uma descendência não sacerdotal. Elcana viveu em Ramá (I Samuel 1:19; 2:11) região montanhosa de Efraim (por isso ele era chamado de efraimita). Como os levitas não receberam terras como herança (Deuteronômio 10:9), as demais tribos cederam cidades para eles morarem na proporção de seus territórios (ver Josué, capítulo 21). As famílias descendentes de Coate foram beneficiadas com algumas cidades, entre as quais localizadas geograficamente nos territórios da tribo de Efraim (ver Josué 21:5 e I Crônicas 6:66).
Elcana era casado com duas mulheres, permitido na época, por tratar-se de uma situação especial com base em um dispositivo da lei judaica (ver Deuteronômio 21:15). O nome de uma era Ana, com a qual não tinha filhos, por ser estéril, e o nome da outra mulher era Penina, com a qual ele teve filhos e filhas (I Samuel 1:2, 4 e 5). Elcana ia ao santuário de ano em ano e em uma de suas visitas, quando oferecia o seu sacrifício, ele deu a porção do sacrifício para a sua esposa Penina e porções a cada um de seus filhos e filhas. Contudo, a Ana ele deu uma porção dupla, porque ele amava Ana, ainda que Deus a tivesse privado de ter filhos (I Samuel 1:4 e 5). Assim ele fazia todos os anos e cada vez que ele ia ao santuário, Penina aproveitava para escarnecer de Ana por ela não ter filhos. Em profunda tristeza, aborrecida com sua infertilidade, Ana chorava e orava. Seu marido debalde a procurou consolar (I Samuel 1:8). Mais tarde, na angústia de seu espírito, Ana mais uma vez orou e chorou abundantemente, rogando a Deus que lhe tirasse a ignomínia e lhe concedesse um filho. Naquele instante ela fez um voto solene de que, se seu pedido fosse satisfeito, levaria o seu filho, assim que estivesse desmamado, para viver no santuário em Siló e o dedicaria a Deus por todos os dias da sua vida, com a promessa de que pela sua cabeça não passaria navalha (I Samuel 1:11).
Ao ver Ana mover os lábios em silêncio enquanto orava, Eli, o sumo sacerdote, acusou-a de estar bêbada. Julgando administrar uma repreensão merecida, disse com severidade: “Até quando estarás tu embriagada? Aparta de ti o teu vinho.” I Samuel 1:14. Mas depois que Ana protestou, condoída e surpresa, ela respondeu-lhe que não havia bebido vinho e nem bebida forte, mas apenas derramou a alma perante o Senhor (I Samuel 1:15). Eli abençoou-a e pediu a Deus que atendesse ao pedido dela.
Voltando ao seu país, ficou grávida e teve um filho a quem seus pais chamaram de Samuel, isto é, “ouvido por Deus”. Ana para cumprir o seu voto, consagrou o menino a Deus logo após ele ter sido desmamado (talvez já com a idade de pelo menos 3 anos, segundo as normas registradas em II Crônicas 31:16). Ana levou-o a Siló, deixando-o entregue aos cuidados do sumo sacerdote Eli, o qual nunca dantes vira tanto fervor, tanta devoção, tanto amor a Deus, como os revelados no rosto de Ana.
Enquanto ainda criança, Samuel ministrava no templo, diante de Deus, sob as instruções do sumo sacerdote Eli. O menino trajava-se simplesmente com um éfode de linho que sua mãe lhe fazia anualmente com suas próprias mãos e toda vez que Ana subia com o seu esposo para adorar em Siló, levava ao menino esta lembrança de amor.
À medida que o menino Samuel crescia, fazia-se agradável para com Deus como também para com os homens (I Samuel 2:26).
III – DEUS FALA COM SAMUEL
Quando Deus chamou o jovem adolescente Samuel, o povo de Israel estava atravessando uma grave crise espiritual sem precedentes. Eli era sumo sacerdote e juiz em todo o território de Israel. Ele tinha sido divinamente escolhido para os sagrados deveres do sacerdócio e na função de juiz ele era olhado como um exemplo, exercendo grande influência sobre as demais tribos de Israel. Embora ele tivesse sido designado para governar o povo, não governava a sua própria casa. Eli era um pai transigente, pois não exercia a sua autoridade para corrigir os maus hábitos e paixões de seus filhos, Hofni e Finéias. Deus o havia advertido por causa da impiedade que seus dois filhos praticavam, principalmente por terem violado o sagrado ofício ao exigirem o melhor pedaço de carne dos animais, que deviam ser oferecidos como sacrifício. Embora Eli os tivesse alertado de que não seria possível uma intercessão para pecados cometidos diretamente contra Deus, os dois continuaram a abusar de seus privilégios e a praticar outros atos abomináveis. Posteriormente Deus enviou um profeta desconhecido a fim de anunciar a Eli o fim do direito familiar de herdar o sacerdócio e profetizar a morte de seus dois filhos que ocorreria num mesmo dia. A situação era muito grave. Deus responsabilizou Eli, como sacerdote e juiz, por sua negligência de reprovar o mal praticado por seus filhos e consequentemente pela aterradora condição moral e religiosa em que se achava o povo de Israel. Diante desta situação Deus não mais podia comunicar-Se com o sumo sacerdote e seus filhos.
Em meio a essa degradação espiritual, Deus chama o menino Samuel para o ofício de profeta. Samuel dormia no templo onde se achava a arca de Deus (I Samuel 3:3). É evidente que a área do tabernáculo onde Samuel dormia, não era o santíssimo. Ele como levita coatita, não sacerdotal, não tinha o direito de ver a Arca ou qualquer outra mobília sagrada dentro do santuário, com base nas instruções dadas por Deus a Moisés e Arão, registradas em Números 4:17-20.
Certa noite, quando dormia, Deus chamou-o pelo nome. Supondo ser a voz de Eli, o menino foi apressadamente para junto do leito do sacerdote. Mas este assegurou-lhe que não o havia chamado. Depois de isso ocorrer três vezes, Eli se convenceu de que aquele misterioso chamado era a voz de Deus. Ele instruiu o menino a responder o chamado com as seguintes palavras: “Fala, Senhor, porque o Teu servo ouve.” I Samuel 3:9. Então Samuel foi e se deitou no seu lugar. Quando Samuel atendeu ao quarto chamado, Deus revelou a ele notícias chocantes, relacionadas ao Seu julgamento contra a casa de Eli. Disse Deus a Samuel: “Eu farei algo em Israel que fará tinir ambos os ouvidos de qualquer um que ouvir sobre isso. Nesse dia, farei contra a casa de Eli todas as coisas que eu disse com respeito à família dele, do início até o fim. Porque Eu disse a ele que executarei o julgamento contra a sua família para sempre, por causa da sua impiedade em não repreender seus filhos, embora ele soubesse que eles estavam trazendo maldição sobre si mesmos. Portanto, Eu jurei à família de Eli que a impiedade da família de Eli nunca será expiada por nenhum sacrifício ou oferta.” I Samuel 3:11-14.
Na manhã seguinte, Eli insistiu que o atemorizado menino lhe contasse a mensagem dada por Deus. A mensagem não era estranha ao sacerdote Eli. Em resposta o idoso sacerdote disse: “Ele é Deus, que Ele faça o que Lhe parece bem.” I Samuel 3:18. Todo o Israel, de Dan até Berseba, reconhecia que Samuel tinha sido confirmado como profeta de Deus.
IV – SAMUEL CONDUZ ISRAEL À ADORAÇÃO VERDADEIRA
Algum tempo depois cumpriu-se o juízo de Deus contra a casa de Eli, com a morte dos seus dois filhos em uma batalha contra os filisteus (I Samuel 4:17). Na mesma ocasião a arca de Deus foi capturada, levada pelos filisteus à cidade de Asdode, uma de suas cinco cidades principais e por fim colocada na casa de seu deus Dagon (I Samuel 5:1 e 2). Quando Eli soube da triste notícia, caiu da cadeira para trás, quebrou o pescoço e morreu.
A arca de Deus permaneceu no território dos filisteus por sete meses, causando-lhes destruição, pragas, moléstias e muita aflição. Ansiosos por se livrarem de sua presença, os filisteus consultaram seus sacerdotes, bem como os adivinhos e estes propuseram devolver a arca de Deus aos israelitas (I Samuel 6:1-3). Ela foi colocada em um carro novo, conduzida por duas vacas sobre cujo pescoço nunca havia sido posto jugo. Se as vacas avançassem sem seus bezerros, os quais haviam sido presos, e seguissem o caminho até chegar à cidade de Bete-Semes, os filisteus deviam considerar isso como sinal de que haviam procedido bem e de que todas as calamidades que haviam sofrido provinham de haver retido a arca. Sem serem guiados por mãos humanas, mas conduzidos unicamente pela presença divina, os pacientes animais levaram a arca sagrada com segurança exatamente ao local previamente anunciado pelos filisteus. Entrando na terra de Israel, chegaram à localidade de Bete-Semes. Não sabendo como lidar com ela, o povo enviou uma mensagem aos habitantes de Quiriate-Jearim, os quais, com grande alegria receberam o sagrado receptáculo, levando-a até a sua cidade, e a colocaram na casa de Abinadabe. O seu filho, de nome Eleazar, foi consagrado pelos homens de Quiriate-Jearim para guardar a arca de Deus (I Samuel 7:1).
Por exortação de Samuel, os israelitas abandonaram a adoração idólatra e começaram a servir somente ao único Deus (I Samuel 7:2-4). Em seguida, Samuel mandou os israelitas reunirem-se em Mispá. Ali teve lugar um jejum solene e com profunda humilhação o povo confessou os seus pecados. Em Mispá Samuel começou a exercer sua função como juiz sobre o povo de Israel.
Aquela grande assembléia religiosa foi vista pelos filisteus como uma oportunidade perfeita para atacar e dispersar os israelitas. A notícia de sua aproximação causou grande terror ao povo de Israel. O povo rogou ao profeta Samuel: “Não pare de clamar a Deus por nós, para que nos salve do poder dos filisteus.” I Samuel 7:8. Então Samuel tomou um cordeirinho e o ofereceu inteiro, como oferta queimada a Deus. Naturalmente, por não ser descendente da raiz genealógica de Arão e consequentemente não pertencer à família sacerdotal, Samuel não estava autorizado legalmente a oficiar como sacerdote no altar do santuário. Não há registro na Palavra de Deus que ele tenha feito isto alguma vez. Todavia, como representante e profeta de Deus, ele podia oferecer sacrifícios em qualquer outro lugar, sob a direção divina, assim como fizeram Gideão (Juízes 6:25-28), o profeta Elias (I Reis 18:36-38) e o rei Davi (I Crônicas 21:26). Enquanto Samuel estava apresentando aquela oferta, os filisteus se aproximaram para a batalha. Porém, a voz de Deus trovejou violentamente sobre eles, lançando-os em grande confusão. Assim, em resposta à oração de Samuel os israelitas tiveram uma decisiva vitória ao perseguirem os filisteus desde Mispá até Bete-Car. A fim de que essa ocasião jamais fosse esquecida, Samuel tomou uma pedra e a colocou entre Mispá e Sem, como memorial de sua libertação, e deu-lhe o nome de Ebenezer, que significa “pedra de ajuda”, dizendo ao povo: “Até aqui Deus nos ajudou.” I Samuel 7:12. Esta assinalada vitória foi ganha no mesmo campo em que vinte anos antes, o exército de Israel fora ferido diante dos filisteus, tendo sido mortos os sacerdotes e tomada a arca de Deus (I Samuel 4:1-11).
A firmeza de caráter do profeta Samuel como juiz de Israel e a decisão do povo em abandonar a idolatria e se consagrar a Deus, fizeram com que os filisteus agora fossem humilhados, de modo que não mais entraram no território de Israel. Eles se abstiveram de quaisquer atos de hostilidade contra os israelitas durante todo o tempo que o profeta Samuel viveu. Nesse tempo os filisteus sofreram alguns reveses adicionais. As cidades que eles haviam tomado de Israel foram restituídas, desde Ecrom até Gate e durante esse período houve paz entre Israel e mesmo entre os amorreus (I Samuel 7:13 e 14).
V – A ESCOLHA DO PRIMEIRO REI DE ISRAEL
Desde quando os israelitas se estabeleceram em Canaã, eles reconheciam os princípios da teocracia, isto é, desejaram que o governo de Israel fosse administrado em nome e pela autoridade de Deus. Por essa razão, de tempos em tempos, Deus enviou homens inspirados para instruírem o povo e guiá-lo na execução das leis. Samuel era um desses homens especiais e tem se tornado bastante conhecido como profeta, conduzindo o povo basicamente em um papel judicial. Durante os anos de sua administração vigorosa o país esteve livre da dominação estrangeira.
Samuel e sua esposa, de nome desconhecido, tiveram dois filhos, Joel e Abias. Com o avançar dos anos, tendo ele envelhecido, Samuel constituiu seus filhos como juízes sobre Israel, na localidade de Berseba. Eles por si mesmos provaram desmerecedores de sua alta confiança, tornando-se tão corruptos quanto os filhos de Eli, o que motivou alguns anciãos a tirarem vantagem desse problema familiar, pressionando Samuel a indicar um rei sobre eles. Está relatado que “todos os anciãos de Israel se congregaram, e vieram ter com Samuel, em Ramá, e disseram-lhe: Eis que já estás velho, e teus filhos não andam pelos teus caminhos. Constitui-nos, pois, agora um rei sobre nós, para que ele nos julgue, como o têm todas as nações.” I Samuel 8:4 e 5.
Sentindo-se rejeitado, Samuel orou e em resposta à sua oração Deus exorta-o que o pedido dos anciãos fosse atendido, pois eles não haviam manifestado desrespeito para com ele, mas para com a autoridade de Deus, que havia designado os príncipes de Seu povo (I Samuel 8:7). Seguindo as ordens de Deus, Samuel expôs as conseqüências da monarquia dizendo que reis tomariam os seus melhores campos e os seus bois e jumentos; eles convocariam seus filhos e servos e os tomariam para seus serviços, e exigiriam um pesado dízimo, além de outras exigências (I Samuel 8:11-17).
Embora informados por Samuel de que a monarquia resultaria na perda de certas liberdades, tornando-os como escravos, o povo ainda assim insistiu em ter um rei. Depois de Samuel ter despedido os homens de Israel, a narrativa bíblica passa a descrever com precisão o plano do próprio Deus de encontrar um príncipe ideal como resposta positiva às orações feitas em prol da defesa de Seu povo. A escolha recaiu sobre Saul, filho de Quis, da tribo de Benjamim. Saul aparece como o homem mais belo e mais alto de Israel (I Samuel 9:2). Após procurar sem sucesso durante três dias pelas jumentas desgarradas de seu pai, o jovem procurou o profeta para que ele obtivesse resposta da parte de Deus onde poderia encontrar os animais. No dia anterior, Deus tinha dito a Samuel: “Amanhã a estas horas te enviarei um homem da terra de Benjamim. Unge-o por príncipe sobre o Meu povo de Israel; ...” I Samuel 9:16. Quando Samuel se encontrou com Saul, Deus lhe disse: “Eis aqui o homem de quem eu te falei. Este dominará sobre o Meu povo.” I Samuel 9:17. Nesse encontro Samuel assegurou ao jovem Saul que as suas jumentas tinham sido encontradas e insistiu com ele para que ficasse e participasse de uma refeição especial, dando ao mesmo tempo alguma indicação do grande destino que o esperava. Saul humildemente demonstrou-se surpreso, lembrando ao profeta que a sua tribo era a menor de todas as de Israel e a sua família era a mais modesta da tribo. Apesar disso, Samuel assentou Saul na cabeceira da mesa entre 30 convidados e serviu-lhe a melhor porção da carne. Quando Saul partiu, cedo na manhã seguinte, o profeta saiu com ele e desceram até os limites da cidade. Então o profeta ordenou a Saul que o seu servo, que lhe acompanhava, seguisse adiante o seu caminho. Então ordenou a Saul que esperasse um pouco para que pudesse transmitir uma mensagem a ele enviada por Deus.
“Então Samuel tomou um vaso de azeite, e o derramou sobre a cabeça de Saul, e o beijou, e disse: Porventura não te ungiu o Senhor para ser príncipe sobre a Sua herança?” I Samuel 10:1.
Contou-lhe em seguida a respeito dos vários sinais futuros que receberia em confirmação de que isto fora feito por autorização divina (ver I Samuel 10:2-6). Tendo seguido Saul o seu caminho, tudo aconteceu conforme dissera o profeta.
Após isso, Samuel providenciou que os israelitas se reunissem em Mispá, e ali Saul foi designado rei por meio de uma solene cerimônia de lançar a sorte (I Samuel 10:17-24). Durante a realização do sorteio, aquele jovem tímido havia se escondido no meio das bagagens dos viajantes reunidos para o encontro. Trazido à congregação, a maioria do povo o aclamou dizendo: “Viva o rei!” I Samuel 10:24. Samuel então expôs ao povo os regulamentos que deveriam ser obedecidos no reino, escrevendo-os num livro e em seguida colocou-os diante de Deus.
Após a vitória de Saul sobre os amonitas, Samuel reuniu o povo de Israel em Gilgal, para reafirmar sua lealdade ao rei (I Samuel 11:14). Foi em Gilgal que ocorreu o primeiro acampamento de Israel na terra prometida (Josué 4:19). Foi ali que Josué, por determinação divina, erigiu uma coluna de doze pedras para comemorar a miraculosa passagem do Jordão (Josué 4:20). Naquele local foi celebrada a primeira Páscoa, depois do pecado de Cades e da peregrinação no deserto (Josué 5:10). Foi ali que cessou de cair o maná (Josué 5:10 e 12). Nesta ocasião, já com idade bastante avançada, Samuel fez o seu discurso de despedida e recapitulou sua própria atuação, bem como a história passada de Israel, recordando o pedido tolo do povo por um rei e mostrou que, para conservar a aprovação divina, era necessária a obediência do rei e do povo a Deus. Para inculcar neles a seriedade de terem rejeitado a Deus como Rei, Samuel orou pedindo um temporal fora de época. A resposta de Deus a esta petição motivou o povo a reconhecer a seriedade da sua transgressão (I Samuel 12:13-24). Depois de interceder pelo povo, Samuel alertou: “Se, porém, perseverares em fazer o mal, perecereis; assim vós como o vosso rei.” I Samuel 12:25.
Após reinar dois anos sobre Israel, o rei Saul criou dois problemas graves de relacionamento com o profeta Samuel, ao desobedecer à orientação divina. No primeiro caso, Saul, movido por um ato de desespero diante de uma iminente guerra contra os filisteus, havia presunçosamente adiantado um holocausto, em vez de esperar a chegada do profeta, conforme se lhe havia ordenado. Por causa desse ato de desobediência, Samuel anunciou que Deus lhe tiraria o reino e daria a “um homem segundo o Seu coração.” (I Samuel 13:14). No segundo caso, a questão envolvia os amalequitas, povo com quem os israelitas lutaram desde o tempo de Moisés, quando atravessaram o deserto, após sua saída do Egito. Naquela oportunidade Deus prometeu que iria destruir totalmente aquele povo (Êxodo 17:8-16). Samuel manda Saul cumprir esses votos, anunciando-lhe o seguinte: “Vai, pois, agora e fere a Amaleque, e o destrói totalmente com tudo o que tiver; não o poupes, porém matarás homens e mulheres, meninos e crianças de peito, bois e ovelhas, camelos e jumentos.” I Samuel 15:3. Ao invés de destruir tudo, Saul manteve vivo o rei Agague, bem como o melhor dos rebanhos e das manadas dos amalequitas. Samuel enfrenta Saul, que tenta justificar seus atos como perfeitamente corretos e bem intencionados. Rejeitando a oferta de arrependimento do rei, Samuel declarou: “Deus rasgou de ti hoje o reino de Israel, e o deu a um teu próximo, que é melhor do que tu.” I Samuel 15:28. Depois disso, Samuel ordenou a Saul que trouxesse o cativo Agague diante dele. Depois de recitar os terríveis crimes praticados pelos amalequitas, Samuel retalhou Agague perante Deus, em Gilgal (I Samuel 15:33) O profeta retornou à localidade de Ramá, para jamais em sua vida voltar a ver Saul.
VI – O PROFETA SAMUEL UNGE DAVI COMO REI DE ISRAEL
Depois da separação, Samuel e Saul nunca mais se viram. Samuel, porém, passou a prantear por Saul. Por causa desses sentimentos controversos de Samuel, Deus o repreendeu dizendo: “Até quando terás dó de Saul, havendo-o Eu rejeitado, para que não reine sobre Israel?” I Samuel 16:1. Deus mandou Samuel encher um vaso de azeite e comissionou-o a ir a Belém, ao sul de Jerusalém, com a finalidade de ungir um dos filhos de Jessé como futuro rei de Israel, no lugar de Saul. Nesta sua viagem à Belém, Samuel tinha que passar por Gibeá, a cidade natal de Saul. Para evitar qualquer suspeita por parte de Saul, que pudesse resultar na morte de Samuel, Deus o instruiu para levar consigo uma novilha e avisar que ia oferecer um sacrifício. Quando Samuel chegou com total segurança em Belém, os anciãos, tremendo, lhe perguntaram se sua vinda era de paz. Mas, mantendo segredo de sua intenção de ungir um novo rei, ele assegurou-lhes que sua vinda significava paz e convidou os anciãos, bem como Jessé e seus filhos para o sacrifício.
Toda a casa de Jessé estava presente, com exceção de Davi, o filho mais moço, que ficara a guardar as ovelhas, pois que não era seguro deixar os rebanhos sem proteção. Na casa de Jessé, Samuel examinou cada um dos sete filhos ali presentes. Impressionado pela aparência de Eliabe, o primogênito de Jessé, Samuel raciocinou que este tinha que ser o escolhido para a realeza. Contudo Deus instruiu Samuel a não julgar pelas aparências: “Não atentes para sua aparência, nem para a grandeza da sua estatura, porque Eu o rejeitei; porque Deus não vê como vê o homem, pois o homem olha para o que está diante dos olhos, porém, Deus olha para o coração.” I Samuel 16:7. Nenhum daqueles sete filhos foi escolhido por Deus. Disse, pois, Samuel a Jessé: “São estes todos os teus filhos?” I Samuel 16:11. Diante da insistência de Samuel, Jessé manda trazer o caçula, o seu oitavo filho, que pastoreava as ovelhas no campo.
Então, sob a direção de Deus, e para espanto de todos, Samuel, tomando o vaso de azeite, ungiu Davi na presença de seus irmãos. Diz o relato bíblico que “daquele dia em diante o Espírito de Deus se apoderou de Davi.” I Samuel 16:13.
Davi que fora forçado a se esconder do rei Saul, visitou Samuel em Ramá e ambos fugiram para Naiote (I Samuel 19:18). Davi permaneceu ali até que o próprio Saul veio à procura dele. Quando Saul tentou se aproximar de Davi entre os profetas de Naiote, o Espírito de Deus se apossou dele e o despojou de suas vestes deixando-o nu durante todo aquele dia e toda aquela noite. Durante o tempo em que Davi ainda estava sob restrição por causa de Saul, “morreu Samuel; e todo o Israel se ajuntou e o prateou. E o sepultaram na sua casa, em Ramá.” I Samuel 25:1.
VII – CONCLUSÃO
A história de Samuel é fascinante. Seguindo a orientação e autorização de Deus, ele esteve à frente para realizar a transição da teocracia para a monarquia em Israel, pondo fim ao período dos juízes. As seguintes passagens atestam o ministério de Samuel como profeta e juiz respectivamente:
“E todo o Israel, desde Dã até Berseba, conheceu que Samuel estava confirmado como profeta do Senhor.” I Samuel 3:20
“Samuel julgou a Israel todos os dias da sua vida. De ano em ano rodeava por Betel, Gilgal e Mizpá, julgando a Israel em todos esses lugares. Depois voltava para Ramá, onde estava a sua casa, e ali julgava a Israel; e edificou ali um altar ao Senhor.” I Samuel 7:15-17.
Samuel pertencia a tribo de Levi da genealogia de Coate (I Crônicas 6:16-30, 33-38), assim como Arão (I Crônicas 6:1-3). Samuel, contudo pertencia à família de Izar (I Crônicas 33-38), enquanto que Arão pertencia à família de Anrão (I Crônicas 6:2 e 3). Cabe aqui esclarecer que, mesmo que Samuel fosse da raiz genealógica de Anrão, mas não descendente de Arão, ainda assim, não poderia pertencer à família sacerdotal.
O requisito da lei mosaica, também chamada de Torá, é específico e claro ao legislar sobre a questão do sacerdócio, regulamentando que todo sacerdote deveria ser levita (descendente de Levi, filho de Jacó) da geração de Arão. Em Êxodo 28:1, 41 e capítulo 29 está relatada a eleição e consagração de Arão e seus filhos ao sacerdócio. Em Números 3:6-10, encontramos estabelecidas duas classes dos levitas: a) Arão e seus descendentes, a quem Deus selecionou para o sacerdócio de Israel, e b) os não descendentes de Arão que serviam de auxiliares aos sacerdotes, e desempenhavam diversos ofícios menores do santuário. Samuel fazia parte desta classe, pois ele era levita, mas não descendente de Arão. É oportuno esclarecer que todo o sacerdote era levita, mas nem todo levita era sacerdote.
O profeta Samuel morreu tendo a aprovação de Deus, após uma vida de serviço fiel (Salmos 99:6; Jeremias 15:1 e Hebreus 11:32). Ele foi persistente em cumprir a sua missão e fiel à adoração verdadeira (I Samuel 7:3-6). Em todos os seus procedimentos ele era honesto (I Samuel 12:3), corajoso e firme em anunciar e sustentar os julgamentos e as decisões de Deus (I Samuel 10:24; 13:13; 15:32 e 33).
A última menção feita a Samuel diz respeito ao relato sobre Saul, quando foi pedir a uma médium espírita em En-Dor que lhe fizesse subir Samuel (I Samuel 28:1-25). Por ser um tema de grande importância, o mesmo encontra-se postado neste site, sob o título: “Objeções dos Imortalistas” (Objeção II- Saul e a feiticeira de En-Dor).